Eu sempre tento tirar ensinamentos de situações ruins. Sou a pessoa que olha o copo mais cheio do que vazio, a que busca sempre encontrar o lado bom de tudo. Duda, inclusive, odeia esse meu lado super positivo hahahaha, mas eu realmente acredito nessa teoria. Se não veio para a felicidade, veio para ensinar, e todo aprendizado é válido. No relato que vou compartilhar hoje eu ganhei os dois, felicidade e aprendizado.
Madrid sempre foi a primeira opção dessa nossa aventura, mas por um tempo, fomos convencidas por um amigo de que Barcelona seria o ideal. Uma cidade mais animada, com mais calor humano, festas, praia... mas mesmo com tudo isso não estávamos convictas dessa decisão, e quase nos 45 minutos do segundo tempo, mudamos todos os planos para a capital da Espanha. Sabe quando o universo conspira a favor? Então, depois dessa decisão as pendências que faltavam resolver simplesmente fluíram. A principal delas, um lugar para passar o primeiro mês, que ainda não tinha saído do papel, foi finalmente alugado.
No anúncio do Airbnb dizia: lugar charmoso, bem localizado, e, aparentemente, um apartamento inteiro para mim e minha filha. Mas como meu espanhol ainda tá longe de ser 100%, não tinha entendido que habitación era só um quarto e que o apartamento seria compartilhado. Mas antes esse fosse o pior dos problemas.
Realmente ele é bem localizado, mas é o ÚNICO benefício dele. Eu nem sei como que um lugar sem janela e o mínimo de luz natural e ventilação pode ser chamado de casa. O prédio é velho, frio, roupas penduradas no vão central impedindo ainda mais o único e possível raio de sol entrar, tem 350 apartamentos por andar e não tem o melhor cheiro da vida. Sabe um cortiço? Então, é isso. E onde tá o lado bom disso tudo, Emiliana? Calma que já vou explicar.
Não pense que em algum momento tenha batido o arrependimento de ter trocado o meu apartamento maravilhoso em Brasília, que ocupava um andar inteiro do prédio, com o terraço mais charmoso da região e com o pôr do sol mais lindo do mundo que eu podia apreciar diariamente, fosse da janela do meu quarto ou dançando um forrozinho lá fora, por algo incerto porque esse sentimento não veio à tona. Eu tenho consciência do que eu tinha e do que eu abri mão. Eu sei dos motivos que me trouxeram até aqui e dos possíveis perrengues que eu teria que passar. Mas mesmo sabendo do que pode acontecer, por mais que a gente se prepare para o pior, não tem como prever como vai ser, a não ser quando você de fato vivenciar aquela situação. E eu precisava viver isso.
Aluguei esse apartamento por um mês achando que seria uma boa jogada e tá sendo a pior e a melhor experiência passar esses dias aqui. A pior porque eu entendi que eu PRECISO de luz natural para viver. Acordar todos os dias meio dia (porque dentro de casa parece noite o dia todo) sem saber se o dia tá chuvoso ou com um sol radiante, tá sendo estressante e depressivo. Passar esses dias aqui me fez entender o que eu NÃO QUERO pra minha nova casa. Que posso ter um lugar simples pra recomeçar, mas que isso não precisa ser o antônimo de aconchego. Como ver isso como algo bom? Simples. Entender o que você não gosta e não suporta conviver é uma descoberta fantástica e, além de fazer você querer agir diferente, faz você valorizar e apreciar ainda mais o que um dia teve e o que ainda vai conquistar. Por exemplo, eu já consigo sentir a brisa entrando pela janela da minha nova casa, gelando a ponta do meu nariz, enquanto aprecio o meu café com canela matinal. Tá, mas e as pessoas da foto, onde elas entram? Elas entram na melhor parte disso tudo, nas conexões.
Antes que eu os conhecesse, a primeira pessoa que dividiu o apertamento (sim, isso é um aperto) comigo foi a Maria. Uma boliviana linda, animada, de olhos e sorrisos expressivos e tão disposta a me ajudar que muitas vezes me deixava constrangida. Com ela pude trocar muitas risadas, informações, e foi a primeira pessoa que eu pude treinar o meu espanhol meia boca. E por mais insegura que eu me sentisse ela me incentivava a continuar. Mas quando foi chegando o dia dela ir embora o coração foi ficando apertado e angustiado pensando se a próxima pessoa seria tão boa (ou bom) quanto. Fiz uma prece e pedi a Deus que enviasse alguém tranquilo para que tivéssemos uma boa convivência nos próximos 13 dias, tempo que faltava para a minha estadia nesse lugar horrível acabar. E Deus não apenas mandou uma pessoa incrível, mas sim três. Um combo completo. Um casal peruano que acabara de chegar em Madrid para visitar seu filho que não viam há dois anos. Talia, uma mulher peruana que conheceu seu marido alemão, Dieter, nas aulas que ele lecionava (sim, ela catou o professor hahaha) na cidade dela. E dessa história nasceu Tomás, que tem dupla nacionalidade, fala fluentemente os dois idiomas mais o inglês, e que hoje estuda fotografia em Madrid. Uma mistura de Eduardo e Mônica com Faroeste Caboclo, né, mas com algumas alterações de roteiro.
Além das canções do nosso queridíssimo Renato Russo, conhecê-los também me lembrou o meu livro de cabeceira, Amores ao Sol, do Lucão. No livro ele narra a história de Luca que resolveu fazer o caminho de Santiago de Compostela, na Espanha. Durante o percurso ele conhece várias pessoas e se conecta com algumas delas. Seu Joaquim é uma delas. Um senhor com mais ou menos seus 70 anos, que fala sobre a vida de uma perspectiva mais ampla, de quem já viveu e experienciou muita coisa, e compartilha com Luca muitas de suas vivências. O livro é inspirador e apaixonante. A forma como ele narra as dificuldades, as dores e as delícias do caminho de Santiago nos inspira a apreciar ainda mais o caminho que chamamos de vida. E esse conviver com esse casal me fez sentir um pouco disso.
Não perguntei, mas as expressões e as marcas na pele indicam que já cruzaram a linha da melhor idade. Desde que nos conhecemos o diálogo foi instantâneo. Ouvi-los falar sobre a vida e suas experiências soava como música para meus ouvidos, ainda mais quando dividimos a mesma opinião sobre coisas polêmicas. Observar Talia narrar as belezas da sua cidade e do seu país me fez lembrar, mesmo que isso seja impossível de esquecer, das belezas do meu. Chorei ao olhar as fotos do jardim de sua casa, porque me remeteram à vista linda que tive o privilégio de ter durante os 5 anos de Ateliê. A mágoa que ela carrega da história de viver num país que foi colonizado pelo país que tivemos a alegria de nos conhecer, despertou em mim sentimentos contraditórios de estar em continente Europeu. E, assim como eu, Talia, Dieter e Tomas, se sentiram lesados ao alugar esse apartamento. Não foi o meu espanhol ruim que não entendeu o que dizia o anúncio, ele realmente não estava claro.
Já percebeu que a dor conecta mais que o amor? Sim, é verdade, e quando eu for falar de BTS eu vou comprovar essa teoria. A gente amou compartilhar nossas alegrias, mas quando eles contataram o responsável pelo apartamento para cobrar coisas que estavam no anúncio e ele os respondeu com grosseria, aí que a gente se uniu. A revolta pairava o ar desse lugar. Vendo a angústia deles em ter que dormir mais uma noite nesse muquifo, comecei a ajudá-los na busca por um lugar novo. O relógio marcava quase 00h quando achei um apartamento. Parecia bem confortável, um pouco mais longe do centro, mas com o valor bem acessível pra quem precisava disso pra ontem. Instruí-los a entrarem em contato com o anfitrião para saber se poderiam ir naquela hora, e, diferentemente do anfitrião daqui, respondeu de prontidão que sim.
Depois disso não pararam mais de me agradecer. O que na verdade nem precisava, porque, na minha cabeça, eu não fiz nada demais. Acredito que pegar o celular e ajudar alguém a buscar um lugar pra dormir é o mínimo que alguém pode fazer, ne? Pois para eles não foi o mínimo, foi motivo de gratidão eterna. Nos despedimos, abraçamos, marcamos um café e pedi que me enviassem fotos do novo lugar. Estava preocupada se o que estava no anúncio era real. No dia seguinte, antes que eu acordasse de verdade, já haviam fotos no meu whatsapp mostrando a nova habitação. Uma janela grande, um raio de sol lindo refletindo na cama e no guarda roupa, uma vista que anima qualquer pessoa a levantar e aproveitar o dia e mais uma mensagem de gratidão. E de cá, um respiro aliviado surgiu depois de saber que deu tudo certo.
Ontem saímos para o café. Foram mais de 2h conversando, comendo, rindo, trocando experiências. Uma conversa que a gente simplesmente não queria que tivesse fim. Mas infelizmente teve. Um abraço apertado em cada um, olhares se encontrando, ora felizes por essa conexão ter acontecido, ora triste pela separação tão repentina, e um até breve pra finalizar. E você deve estar se perguntando agora: "Mas por que essa despedida, se você disse que eles ainda tem pelo menos mais 50 dia em Madrid?". Porque eu e Duda estamos indo pra Portugal, e tudo indica que a parada final será lá.
Como isso veio à tona eu vou deixar pra outro dia, mas por agora eu quero deixar a reflexão inicial dessa história. Em tudo da pra tira algo bom? Sim. Se não for para a felicidade será para o aprendizado. No meio desse caos ganhei amigos lindos e uma estadia gratuita no Peru hahaha e entendi o que é vital para a minha saúde mental.
E pra finalizar, sem papo de coach, só a minha partilha com você, tá? Acredite, olhar o copo meio cheio ao invés de meio vazio vale à pena.
Até já!
Simplesmente amando 💟
Ameiiiii
To emocionada 🥺🥺🥺
Amiga, quando for pro Peru, me leva! Rsrs tá nos meus planos de viagem! é um país incrível! 😁
Muita ótima sorte em Portugal!
😘
Meu Deus , Emili. Eu fiquei chocado com esse final, até tomei um susto kkkkkkkk já trate de escrever os próximos capítulos q tô doido pra ler.
Beijo grande e torço demais por vcs duas.
Com amor,
Matheus